Escrito em: 27/12/1827
Publicado em 12/04/1905, em
"O REFLEXO"
O Sr. Alberto Cunha era metido a conquistador.
Vivia a perseguir D. Rosa, sua vizinha, com olhares ternos e suspiros tolos.
D.Rosa era casada, amava muito seu marido, e com certeza não seria aquele bilontra do Alberto que a faria cometer uma infidelidade.
Alberto começou a mandar-lhe recados pela criada, que não tinha coragem de dizer nada a D. Rosa mas que, para apanhar os cobres do malandro, inventava suas respostas amáveis que mais apaixonado e esperançoso o tornavam.
Resolveu, afinal, dar o golpe decisivo na virtude de Rosa e escreve-lhe uma cartinha amorosa, pedindo-lhe uma entrevista.
Rosa furiosa mostra a carta para o marido, que quis logo moer no páu o caricato Lovelace, mas refletiu um pouco e ditou uma resposta, que estupefata, escreveu Rosa.
Meu querido.
De boa vontade concedo o que me pedes. Meu marido embarcou hoje, logo cedo, no trem da manhã e só virá ao anoitecer. Se quiseres venha hoje ao meio dia.
Tua...
Alberto ficou radiante e disse: nunca julguei tão fácil esta conquista.
o Sr. Alberto se aprontou todo, vestiu seu melhor colete, se olhou no espelho, deu um sorriso de aprovação e saiu a passos largos. Viu Rosa, no alto, a lhe acenar, apertou o passo e atravessou o largo. Subiu e foi logo desembuchando a clássica chapa: Meu anjo, ...e querendo cair-lhe dramáticamente aos pés, mas Rosa, o deteve.
-Espere.
Eu não quero que a criada o veja. Entre neste cômodo e se ponha a vontade. Vou dar ordens na cozinha e já volto.
Alberto obedeceu radiante, entrou para a quarto, tirou o casaco, o colete e os deitou sobre a cadeira.
Viu sua imagem refletida no espelho, gostou da visão, inesperadamente entra em cena o Sr. Roberto, marido da Rosa. Trazia na mão um chicote e a carta. Acompanhado de dois negros fortes e armados. Alberto viu o abismo cuja margem se encontrava.
"Como sou distraído, aqui não é a casa do barbeiro?"
-Cale a boca seu canalha! Aqui não é a casa do barbeiro mas, como vê, há uma navalha aqui, e o Sr vai ver dentro em pouco se ela está bem afiada.
O Sr. vai agora comer todo este bilhete que escreveu, tomar uma sova de chicote e depois...
- Depois o que Sr. Roberto?
- Me perdoi, eu estava embriagado...
Coma o bilhete seu tratante! Anda, engula!
Alberto prontamente o comeu e depois o Roberto lhe passou uma sova de chicote que lhe marcou o corpo e a cara, até que Rosa, de fóra, pediu ao marido que não lhe desse mais.
Diante disso, Alberto aterrorizado, tendo apenas tempo de por o chapéu atirou-se pela sacada e caiu mesmo, de pernas abertas, sobre a cangalha, (entre os dois páus que prendem as alças das cargas), de um dos burros atrelados em baixo da sacada, que se assustou e saiu em disparada.
O Alberto Cunha em colete e cartola, não se aguentava mais, cheio de dores, desfilou naquele mal jeito, pelas ruas por entre assovios e vaias na maior gozação da molecada.
É de crer que depois disso arrepiasse carreira na senda das conquistas.
Mais um caso do Dr. Avellar em Reminiscências de um Médico.
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