Hila Flávia
Passei os
últimos dias muito ansiosa. Quase que contando os dias para o começo da copa do
mundo de futebol. Não só por causa dos jogos, mas pela cerimônia de abertura no
estádio do Corinthians.
Desde que
ouvi pela primeira vez o nome de Miguel Nicolellis fiquei muito interessada no
trabalho dele. Depois, até comprei uma cópia da entrevista que ele concedeu à
Rede Bandeirantes de Televisão e assisti a ela muitas vezes. Procuro saber do
que acontece lá onde ele trabalha no Brasil, que é um instituto situado na
cidade de Natal, no Rio Grande do Norte. Considero suas pesquisas
extraordinárias e leio tudo que a elas se refere. Vivi momentos esperançosos de ver o primeiro paraplégico,
escorado por um aparelho desenvolvido pelo neurocientista e sua equipe, andar e
dar o chute inicial da copa.
O que
aconteceu? Ao certo não sei. Mas surgiram informações de que a FIFA teria
impedido a exibição porque não fazia parte do protocolo da copa. Outra
informação foi de que o aparelho era pesado e machucaria o gramado. E outra era
de que, não tendo sido publicado nas revistas oficiais de medicina o projeto do
cientista, ele ainda não deveria ser mostrado ao público.
Esse assunto
de mobilidade humana mexe comigo. Mesmo porque tenho por certo que danos de preconceito
a gente só consegue avaliar quando é vitima na questão. Somente sabe do que é
preconceito racial o negro, o índio, o oriental ou o que não é igual aos ofensores.
Os demais podem avaliar, mas não sabem o estrago causado. Somente gordos sabem
o que é ser ridicularizado. Muitas vezes não com palavras somente, mas com
risos, olhares e gestos. Mesma coisa com os baixos ou altos acima da média, os
pobres, os homossexuais. Enfim, somente
o ofendido sente a ofensa. Os demais avaliam por causa do sentimento de
empatia, de solidariedade ou de fraternidade. Mesma coisa os cadeirantes,
deficientes e portadores de necessidades especiais de locomoção.
Agora, um
neurocientista brasileiro descobre como liberar deficientes físicos de sua
cadeira, vestindo uma armadura hoje ainda pesada. Amanhã, certamente uma placa
leve nas costas. O que faz o governo brasileiro para valorizar a nossa produção
científica em matéria de tamanha importância mundial? Nada. No que deveria ser uma mostra da
esperança que esse invento traz, usando a maior vitrine do mundo, o governo se
abaixa, mais uma vez, às exigências da famigerada FIFA, uma organização maior
que a ONU, maior que o papado, maior do que tudo. Um big brother que faz e desfaz neste país como se dele fôssemos
reféns e capachos. Muda o estatuto dos estádios e manda liberar bebida
alcoólica, quando isso já havia sido superado. Eleva os preços dos ingressos a
um patamar tal que somente os ricos têm acesso. Enfim, mandam e desmandam. E,
como pá de cal, acabamos por ver uma cerimônia de abertura pífia, muito aquém
do nosso talentoso povo, importada, burocrática e infanto-juvenil. Já promovi,
nas escolas onde lecionei música, em priscas eras, festinhas muito mais
criativas. Cantores que não nos representam, música ininteligível e ruim. Que
significa Jennifer Lopez cantar no Brasil em nosso nome? Nadica de nada. E
aquele cantor cujo nome nem sei? Que é que é isso? Não temos músicos
maravilhosos, dançarinos esplêndidos e a melhor música do mundo? E nossos
coreógrafos, capazes de fazer o maior espetáculo da terra a partir do povo?
Fiquei até pensando que a coreógrafa contratada fosse parenta do presidente da
FIFA. Será? Se for, é o caos do caos.
Enfim, houve
a abertura, ganhamos com dificuldade, ajudados pelos olhinhos fechados do juiz,
mas ganhamos. Não precisava aquela “ajuda”. Vamos em frente que atrás vem
gente.
Excelente texto de protesto amiga Celle.
ResponderExcluir" ... somente o ofendido sente a ofensa. " uma grande verdade!
O poder sempre o poder a comandar os nossos destinos. Lamentável!
beijinho solidário
Fê
obrigada pelo comentário, andado envergonhada!
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