13/12/2010

O Cravo não brigou com a Rosa!

Dois meses antes dos fanáticos do patrulhamento cricri cometerem sua maior lambança em todos os tempos
 — a malograda tentativa de afixarem uma etiqueta de “racista” em Monteiro Lobato —
                o professor Luiz Antonio Simas (*) lançou este antológico artigo.

O Cravo não brigou com a Rosa!
Por Luis Antonio Simas

Chegamos ao limite da onda do politicamente correto. Soube dia desses que as crianças, nas creches e escolas, não cantam mais O cravo brigou com a rosa. A explicação da professora do filho de um camarada foi comovente: a briga entre o cravo - o homem - e a rosa - a mulher - estimula a violência entre os casais. Na nova letra "o cravo encontrou a rosa/ debaixo de uma sacada/o cravo ficou feliz /e a rosa ficou encantada".

 O próximo passo é enquadrar o cravo na Lei Maria da Penha. Será que esses doidos sabem que O cravo brigou com a rosa faz parte de uma suíte de 16 peças que Villa Lobos criou a partir de temas recolhidos no folclore brasileiro?


Outra música infantil que mudou de letra foi Samba Lelê. Na versão da minha infância o negócio era o seguinte: "Samba Lelê tá doente/ Tá com a cabeça quebrada/ Samba Lelê precisava/ É de umas boas palmadas". A palmada na bunda está proibida. Incita a violência contra a menina Lelê. A tia do maternal agora ensina assim: Samba Lelê tá doente/ Com uma febre malvada/ Assim que a febre passar/ A Lelê vai estudar.

Se eu fosse a Lelê, com uma versão dessas, torcia pra febre não passar nunca. Os amigos sabem de quem é Samba Lelê? Villa Lobos de novo. Podiam até registrar a parceria. Ficaria assim: Samba Lelê, de Heitor Villa Lobos e Tia Nilda do Jardim Escola Criança Feliz.

Comunico também que não se pode mais atirar o pau no gato, já que a música desperta nas crianças o desejo de maltratar os bichinhos. Quem entra na roda dança, nos dias atuais, não pode mais ter sete namorados para se casar com um. Sete namorados é coisa de menina fácil. Ninguém mais é pobre ou rico de marré-de-si, para não despertar na garotada o sentido da desigualdade social entre os homens.


Vivemos tempos de não me toques que eu magoo. Quer dizer que ninguém mais pode usar a expressão coisa de viado ? Que me desculpem os paladinos da cartilha da correção, mas isso é uma tremenda babaquice. O politicamente correto é a sepultura do bom humor, da criatividade, da boa sacanagem. A expressão coisa de viado não é, nem a pau (sem duplo sentido), ofensa a bicha alguma.


Nas aulas sobre o barroco mineiro, não poderei mais citar o Aleijadinho. Direi o seguinte: o escultor Antônio Francisco Lisboa tinha necessidades especiais... Não dá. O politicamente correto também gera a morte do apelido, essa tradição fabulosa do Brasil.

O recente Estatuto do Torcedor quer, com os olhos gordos na Copa e 2014, disciplinar as manifestações das torcidas de futebol. Ao invés de mandar o juiz pra p...queopariu e o centroavante pereba tomar (...), cantaremos nas arquibancadas o allegro da Nona Sinfonia de Beethoven, entremeado pelo coro de Jesus, alegria dos homens, do velho Bach.

Falei em velho Bach e me lembrei de outra. A velhice não existe mais. O sujeito cheio de pelancas, doente, acabado, o famoso pé na cova, aquele que dobrou o Cabo da Boa Esperança, o cliente do seguro funeral, o popular tá mais pra lá do que pra cá, já tem motivos para sorrir na beira da sepultura. A velhice agora é simplesmente a "melhor idade".

Se Deus quiser morreremos, todos, gozando da mais perfeita saúde. Defuntos? Não. Seremos os inquilinos do condomínio Cidade do pé junto.

 
* Um resumo do modo de ver de Luiz Antonio Simas que é mestre em História Social pela UFRJ e professor de História do ensino médio. Desenvolve pesquisas sobre a cultura popular carioca.

6 comentários:

  1. Ramon, a virtude está no meio termo.
    Não vejo tanto perigo assim. Os intolerantes existentes são assim, não pelas canções que de criança cantaram, é pela educação que não receberam...
    Obrigada
    Celle

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  2. Celle,
    o pessoal está precisando respirar mais, viver mais, sorrir mais. Tantos grilhões estão sendo construídos que, em breve, até aperto de mão será proibido porque transmite doenças, sorrir será assédio sexual e por aí vai...
    Abraços.
    Ramon

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  3. Ramon, adorei seu humor!
    Concordo plenamente, onde fica o bom senso?
    Beijos

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  4. Sabe, acho que tudo faz parte da educação das crianças; elas têm que saber que há brigas; estão a querer que os miúdos pensem que estão num mundo cor de rosa onde nada de mal acontece: elas tem que aprender de tudo, o que temos é que lhes ensinar que as brigas se resolvem com diálogo e desculpas; o bem e o mal existem e elas têm que estar preparadas para saberem lidar com isso.Um beijinho e vamos lá ensinar as nossas crianças que para tudo há solução e que em tudo é preciso equilibrio
    Emília

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  5. Emilia, concordo com você. A educação é fundamental. A educação de berço, aquela que compete aos pais ensinar e que a escola deveria fixar nas mentes infantis, para que cheguem na adolescencia e idade adulta com suas mentes formadas e desenvolvidas.O mundo seria diferente se toda sua população fosse educada, que os principios e os conceitos morais sociais religiosos filosóficos fossem observados.Cheguei até imaginar o paraiso!!!
    Beijos
    Celle

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