Dois meses antes dos fanáticos do patrulhamento cricri cometerem sua maior lambança em todos os tempos
— a malograda tentativa de afixarem uma etiqueta de “racista” em Monteiro Lobato —
o professor Luiz Antonio Simas (*) lançou este antológico artigo.
O Cravo não brigou com a Rosa!
Por Luis Antonio Simas
Chegamos ao limite da onda do politicamente correto. Soube dia desses que as crianças, nas creches e escolas, não cantam mais O cravo brigou com a rosa. A explicação da professora do filho de um camarada foi comovente: a briga entre o cravo - o homem - e a rosa - a mulher - estimula a violência entre os casais. Na nova letra "o cravo encontrou a rosa/ debaixo de uma sacada/o cravo ficou feliz /e a rosa ficou encantada".
O próximo passo é enquadrar o cravo na Lei Maria da Penha. Será que esses doidos sabem que O cravo brigou com a rosa faz parte de uma suíte de 16 peças que Villa Lobos criou a partir de temas recolhidos no folclore brasileiro?
Outra música infantil que mudou de letra foi Samba Lelê. Na versão da minha infância o negócio era o seguinte: "Samba Lelê tá doente/ Tá com a cabeça quebrada/ Samba Lelê precisava/ É de umas boas palmadas". A palmada na bunda está proibida. Incita a violência contra a menina Lelê. A tia do maternal agora ensina assim: Samba Lelê tá doente/ Com uma febre malvada/ Assim que a febre passar/ A Lelê vai estudar.
Se eu fosse a Lelê, com uma versão dessas, torcia pra febre não passar nunca. Os amigos sabem de quem é Samba Lelê? Villa Lobos de novo. Podiam até registrar a parceria. Ficaria assim: Samba Lelê, de Heitor Villa Lobos e Tia Nilda do Jardim Escola Criança Feliz.
Comunico também que não se pode mais atirar o pau no gato, já que a música desperta nas crianças o desejo de maltratar os bichinhos. Quem entra na roda dança, nos dias atuais, não pode mais ter sete namorados para se casar com um. Sete namorados é coisa de menina fácil. Ninguém mais é pobre ou rico de marré-de-si, para não despertar na garotada o sentido da desigualdade social entre os homens.
Vivemos tempos de não me toques que eu magoo. Quer dizer que ninguém mais pode usar a expressão coisa de viado ? Que me desculpem os paladinos da cartilha da correção, mas isso é uma tremenda babaquice. O politicamente correto é a sepultura do bom humor, da criatividade, da boa sacanagem. A expressão coisa de viado não é, nem a pau (sem duplo sentido), ofensa a bicha alguma.
Nas aulas sobre o barroco mineiro, não poderei mais citar o Aleijadinho. Direi o seguinte: o escultor Antônio Francisco Lisboa tinha necessidades especiais... Não dá. O politicamente correto também gera a morte do apelido, essa tradição fabulosa do Brasil.
O recente Estatuto do Torcedor quer, com os olhos gordos na Copa e 2014, disciplinar as manifestações das torcidas de futebol. Ao invés de mandar o juiz pra p...queopariu e o centroavante pereba tomar (...), cantaremos nas arquibancadas o allegro da Nona Sinfonia de Beethoven, entremeado pelo coro de Jesus, alegria dos homens, do velho Bach.
Falei em velho Bach e me lembrei de outra. A velhice não existe mais. O sujeito cheio de pelancas, doente, acabado, o famoso pé na cova, aquele que dobrou o Cabo da Boa Esperança, o cliente do seguro funeral, o popular tá mais pra lá do que pra cá, já tem motivos para sorrir na beira da sepultura. A velhice agora é simplesmente a "melhor idade".
Se Deus quiser morreremos, todos, gozando da mais perfeita saúde. Defuntos? Não. Seremos os inquilinos do condomínio Cidade do pé junto.
* Um resumo do modo de ver de Luiz Antonio Simas que é mestre em História Social pela UFRJ e professor de História do ensino médio. Desenvolve pesquisas sobre a cultura popular carioca.
Ri muito. Realmente!!!
ResponderExcluirRamon, a virtude está no meio termo.
ResponderExcluirNão vejo tanto perigo assim. Os intolerantes existentes são assim, não pelas canções que de criança cantaram, é pela educação que não receberam...
Obrigada
Celle
Celle,
ResponderExcluiro pessoal está precisando respirar mais, viver mais, sorrir mais. Tantos grilhões estão sendo construídos que, em breve, até aperto de mão será proibido porque transmite doenças, sorrir será assédio sexual e por aí vai...
Abraços.
Ramon
Ramon, adorei seu humor!
ResponderExcluirConcordo plenamente, onde fica o bom senso?
Beijos
Sabe, acho que tudo faz parte da educação das crianças; elas têm que saber que há brigas; estão a querer que os miúdos pensem que estão num mundo cor de rosa onde nada de mal acontece: elas tem que aprender de tudo, o que temos é que lhes ensinar que as brigas se resolvem com diálogo e desculpas; o bem e o mal existem e elas têm que estar preparadas para saberem lidar com isso.Um beijinho e vamos lá ensinar as nossas crianças que para tudo há solução e que em tudo é preciso equilibrio
ResponderExcluirEmília
Emilia, concordo com você. A educação é fundamental. A educação de berço, aquela que compete aos pais ensinar e que a escola deveria fixar nas mentes infantis, para que cheguem na adolescencia e idade adulta com suas mentes formadas e desenvolvidas.O mundo seria diferente se toda sua população fosse educada, que os principios e os conceitos morais sociais religiosos filosóficos fossem observados.Cheguei até imaginar o paraiso!!!
ResponderExcluirBeijos
Celle